Adriana Dutra – Brasília (DF)
Para
quem está em busca de qualificação no exterior, mas não tem condições
financeiras de arcar com os custos desse investimento, o Programa Ciência sem
Fronteiras, do Governo Federal, é a opção ideal. Mas os candidatos devem ficar
atentos aos seus direitos na hora de participar do processo seletivo
Mesmo com o bom momento econômico vivido pelo Brasil,
estudar no exterior ainda é o projeto de vida de muitos brasileiros, em
especial dos mais jovens. Mas a realização desse sonho esbarra, na maioria das vezes,
na falta de oportunidade e de renda. Uma das alternativas para quem está em
busca dequalificação no exterior, mas não teria condições financeiras de arcar
com os custos desse investimento,é o Programa Ciência sem Fronteiras, do
Governo Federal, que oferece bolsas de estudo com esse objetivo. O problema é
quando a burocracia interfere e alguns desses estudantes precisam recorrer à
Justiça.
Foi o que aconteceu com o aluno de Jornalismo Rodrigo
Adamski. Ele sonha em passar pela experiência de ficar um tempo fora do Brasil para
enriquecer seu futuro profissional. “Meu curso está voltado à cultura, ao
conhecimento geral, não está voltado somente ao lugar onde tu vives. A
importância do intercâmbio está nisso, de tu conheceres outros lugares, outras
formas de ensinar, atuações na sua área”, avaliou ele.
Esse sonho começou a se tornar realidade depois que
Rodrigo conheceu o Ciência sem Fronteiras. Ele se inscreveu para estudar na
Universidade de Bolonha, na Itália, e foi aceito no processo seletivo: estava
tudo certo, até que o governo alterou a decisão. “Depois de três meses, de todo
o processo, da esperança, de fazer prova de italiano, de estudar coisas que eu
não tinha esperado estudar até então, chegou um e-mail de indeferimento, por um
motivo relacionado à própria homologação, que era o meu curso”, conta o
estudante.
O
argumento usado para indeferir o pedido foi que o curso de Comunicação Social/
Jornalismo não faria parte das áreas prioritárias do Programa. O candidato
decidiu levar o caso à Justiça. “Eu quis entrar com um processo não apenas para
ir para a Itália, mas para ter acesso àquilo que era meu por direito”, afirma o
estudante. Ele procurou a Defensoria Pública da União, que contestou a posição
do Governo Federal. “Alegamos que, segundo o histórico escolar do Rodrigo, as
matérias cursadas por ele eram inerentes à indústria criativa, que não poderia
ser desvinculada do curso de Comunicação Social”, sustentou a Defensora Pública
Ana Erhardt.
A
Justiça Federal em Pernambuco concordou com a tese da Defensoria e garantiu a
candidatura do estudante. Segundo o juiz federal Ubiratan de Couto Maurício,
qualquer indeferimento deve ser baseado no que está previsto no edital que, no
caso do Ciência sem Fronteiras, definiu as áreas e temas prioritários para os
alunos realizarem disciplinas ou estágio na Itália. “O próprio edital não se
pautou apenas pela escolha prévia e rígida de cursos universitários, preferindo
contemplar campos de estudo, sem atrelá-los a este ou aquele curso, ao
contrário, posicionando-se em prol da amplitude do conhecimento científico”,
frisou na decisão.
Na visão do magistrado, quando a Administração alegou
que o curso do autor não estaria enquadrado nas áreas prioritárias do programa,
contradisse o edital que, dentre as áreas de estudo, elenca: arquitetura, design,
software, jogos de computadores, publicação eletrônica, publicidade, artes,
filme, vídeo, fotografia, música e artes performáticas, televisão, rádio e editoração.
“Ora, alguns desses campos de estudo refletem o perfil curricular do curso do autor.
O histórico acadêmico do aluno inclui as disciplinas de tecnologias
audiovisuais, técnicas digitais, radiojornalismo, design, cinema, telejornalismo,
fotojornalismo, algumas delas já integralmente cursadas pelo estudante. Assim, como
não admitir o curso do autor incluído em área prioritária, se se desdobra em
disciplinas cujos estudos foram contemplados no edital?”, questionou o magistrado.
Com a decisão, a candidatura de Rodrigo foi
restabelecida e ele pôde participar de todas as etapas do Programa, em
igualdade de condições com os demais candidatos. Agora, Rodrigo só pensa em
arrumar as malas e seguir para a Universidade de Bolonha. Destino final: o
conhecimento.
Diferencial
Do ponto de vista profissional, a experiência fora do
Brasil torna o intercambista muito cobiçado no mercado. Por isso, Jéssica
Cantieri Fagundes, que cursa Desenho Industrial na Universidade de Brasília,
após fazer um pequeno intercâmbio nos EUA, decidiu que iria procurar uma nova
oportunidade. “Acredito que terão vantagens aquelas pessoas que saibam falar
mais línguas, que tenham a mente aberta, facilidade de se portar adequadamente
diante de pessoas de várias culturas diferentes e que tenham noção do universo
que existe fora da sua própria cidade”, avalia a estudante, que vê a
experiência fora do País como um elemento de formação do caráter. “Hoje em dia
não há mais essa distinção entre a pessoa que você é no trabalho e a pessoa que
você é na vida. Seu trabalho e sua vida estão cada vez mais ligados e as
melhorias que você faz em um refletem no outro. Viajar, conhecer novos lugares,
enfrentar desafios nunca antes imaginados, só me farão crescer como pessoa e isso
influencia diretamente no tipo de profissional que eu vou ser”, opina.
Jéssica chegou a pesquisar várias possibilidades, sem
sucesso. “Ficar em um país diferente não é algo fácil, mesmo que eu tenha a
sorte de ter uma família que me apoia e que faria tudo para me manter da melhor
forma possível nesse período. Eu precisava avaliar as condições da bolsa, as
ajudas financeiras, o alojamento, a cidade em que iria ficar, custo de vida e
todo o resto”, recorda. Foi quando uma amiga lhe apresentou o programa do
Governo Federal. “Quando eu conheci o Ciência sem Fronteiras, tive a esperança
de que daria certo de verdade. A ajuda que eles dão é muito maior do que a expectativa
e torna o sonho do intercâmbio possível para todo mundo que só precisa desse incentivo
monetário, porque já tem vontade de sobra”, conta.
Além da ajuda financeira, outros aspectos chamaram sua
atenção. “Achei o programa fantástico porque, para muitos países que estavam disponíveis
ali, é dificílimo conseguir uma simples bolsa, o que dirá uma bolsa espetacular
dessas. Eu me recusei a deixar passar”, afirma. A opinião de Jéssica sobre o
programa é acompanhada pelo professor emérito da UnB, Isaac Roitman. “O Ciência
sem Fronteiras é uma oportunidade única para estudantes brasileiros, pois as
universidades com as quais o programa trabalha são instituições de excelência
no exterior. Além de terem a oportunidade de conhecer novas culturas e
sociedades”, resume.
De
malas quase prontas
No caso de Jéssica, com a decisão tomada, faltava
enfrentar o processo seletivo, que ela considerou muito simples. O único
complicador citado por ela foi a falta de organização do Programa. “Teve muita
divergência de informações e dúvidas nunca sanadas. Mas entendo que as
proporções são gigantes e é realmente difícil coordenar tanta coisa acontecendo
ao mesmo tempo pela primeira vez. Espero que nas próximas chamadas o processo
fique mais organizado, mais claro e que os prazos sejam cumpridos”, torce.
O importante é que, para Jéssica, o resultado foi o
esperado. “Ainda era madrugada quando o resultado positivo foi divulgado e eu
fiquei tão feliz que tive que ir acordar meus pais para que eles comemorassem
comigo. Tiveram um pouco de lágrimas, mas só de alegria, todo mundo aqui em
casa ficou triste porque eu ia ficar muito tempo longe, mas extremamente feliz
por eu ter conseguido”, relembra.
Jéssica já está na Coreia do Sul, onde vai ficar um
ano, fazendo um curso de Uso de Novas Tecnologias para o Aprendizado, na
Faculdade Hanyang, em Seul. “Ainda não foi possível escolher as matérias que
irei cursar, mas pretendo me dedicar ao estudo da função do design como intermediador
entre a tecnologia e o usuário, no processo de aprendizado”, explica.
Ela conta que escolheu a Coreia porque um de seus
requisitos era selecionar um país em cuja língua ela ainda não fosse fluente.
“Dentre as opções, a Coreia é o país que mais está crescendo e falar coreano me
abrirá muitas portas, principalmente na minha área, que envolve muita tecnologia.
Além disso, tenho facilidade de aprender a língua. A Coreia é um achado, será um
aprendizado muito grande, que eu espero transformar em sucesso”. Jéssica
explica que, já há alguns anos, se interessa pelo estilo de vida oriental e
que, por isso, procura ter contato com a cultura. “A Coreia do Sul tem muita
coisa linda para mostrar e que pra mim vai ser completamente novo, e eu acho
que não teria um país onde eu pudesse aprender e crescer mais do que na
Coreia”, completa.
A estudante acredita que sua maior dificuldade será a
convivência com as pessoas. “Não tenho problema em fazer amigos, mas estou com
medo de que os coreanos sejam muito fechados. E como quero muito fazer amigos nativos
do país, ficarei triste se não conseguir”. Segundo ela, outra dificuldade será
a distância da família. “Embora a tecnologia esteja a nosso favor, posso dizer
com certeza que vou sentir falta de casa em vários momentos”.
Mas nem a perspectiva dessas dificuldades a assustam ou
a fizeram pensar em desistir. “Isso nunca me passou pela cabeça, não pensei em
desistir nenhuma vez, isso nunca foi uma opção pra mim. Não vejo motivos para
desistir depois que já cheguei tão longe. Aceito o desafio sorrindo quando se
trata de viajar, já escutei algumas pessoas falando que eu deveria ter medo e
que eu era corajosa, mas eu não estou vendo perigo nenhum nessa viagem. O país
é super seguro, tudo está bem arranjado e vou ter muito suporte lá”, conclui.
http://www.jf.jus.br/cjf/comunicacao-social/informativos/revista-via-legal/Revista_ViaLegal_Ed14_comcapa_WEB.pdf/view